sábado, 7 de junho de 2008

Coro dos empregados da câmara - Manuel da Fonseca

É tão vazia a nossa vida
É tão inútil a nossa vida
Que a gente veste de escuro
como se andasse de luto.
Ao menos se alguém morresse
e esse alguém fosse um de nós
e esse um de nós fosse eu...

O sol andando lá fora
Fazendo lume nos vidros
Chegando carros ao largo
com gente que vem de fora
(quem será que vem de fora?)
E a gente p'raqui fechados
na penumbra das paredes
Curvados prássecretárias
Fazendo letra bonita
Fazendo letra bonita
E o vento andando lá fora
Trazendo um grito da rua
(Quem seria que gritou?)
E a gente p'raqui fechados
na penumbra das paredes
curvados p'ras secretárias
fazendo letra bonita
Enchendo impressos, impressos,
livros, livros, folhas soltas,
carimbando, pondo selos,
bocejando, bocejando,
bochejando...

7 comentários:

os violinos tocam de madrugada disse...

É tão maravilhosa a nossa existência
É tão fascinante o nosso quotidiano
Que vamos para a escola
Como se fôssemos fadistas.
E se ao menos alguém nos ouvisse
E esse alguém fosse os nossos alunos
E esse alguém os nossos governantes…

Saindo das nossas casas
Envolvidos pelo Sol
Ao volante das nossas “máquinas”
Será que chegamos a horas?
Claro que sim!
(A escola é mesmo ali ao lado!)
Sem janelas,
O Sol enche os nossos corações de luz.
Uma sinfonia invade a sala
À chamada dos alunos
A aula começa ao ritmo da Preguiça.
Tudo está ausente, excepto a distracção.
Meigamente pedimos atenção,
E eles, compreensivos, nada ouvem, nada dão.
E nós, continuamos a marcar passo.
Até que…
Surge o som, por eles, ansiosamente esperado.
Ecoando, ecoando, ecoando…
Se vão afastando…

Turma 1,
Ana Mendes
Isaltina Marques
Teresa Coelho
Teresa Lopes
Rui Gonçalves

os violinos tocam de madrugada disse...

CORO DOS PROFESSORES RESISTENTES

É tão cheia a nossa vida
É tão útil a nossa vida.

Que a gente vestiu de escuro
Como se de luto andasse
Naquele oito de Março
Tentando derrubar o muro
À espera que algo mudasse.

É tão cheia a nossa vida
É tão útil a nossa vida.

O sol andando lá fora
Fazendo lume nos vidros
E nós cá dentro à nora
Com relatórios, fichas e livros.
(do que será que se irão lembrar agora?)

É tão cheia a nossa vida
É tão útil a nossa vida.

E a gente p’raqui fechados
Na penumbra das escolas
Vivendo sob tensão
Remoendo constantemente
Na malfadada avaliação.

É tão cheia a nossa vida
É tão útil a nossa vida.

E o vento andando lá fora
Rumorejando nas árvores
Levando esperanças
No futuro deste país
(Quem se quer juntar a nós?)

É tão cheia a nossa vida
É tão útil a nossa vida.

E a gente p’raqui fechados
Na penumbra das escolas
Curvados p’rás secretárias
Preenchendo cadernetas,
Escrevinhando relatórios
Telefonando, pondo selos
Lutando, lutando,
Lutando.


Assunção, Cristina, Felicidade e Margarida: T2

os violinos tocam de madrugada disse...

Coro dos Professores burocratas

São tão banais os nossos dias
Tão tristes e surreais
Que a gente anda cabisbaixo
Como se a vida nos maltratasse.
Se ao menos passássemos pela vida
E não fosse ela a passar por nós
E, ao passarmos por ela,
Deixássemos aqui algo de nós…

O funcionário público,
Atrás do seu balcão
Fita e refita o relógio:
“São cinco. Está na hora!”
E a gente continua
(O dia ainda é criança!...)
A toque de caixa
Lá vamos nós.
Trrim! … Trrim!...
A reunião começou
Sem consenso, se atardou.
Trrim! … Trrim!...
O pai, a mãe, a avó
Todos se apressam a opinar.
Falam de tudo…e de nada.
O menino tem dislexia,
O menino tem apatia,
O menino tem azia.
Mas que monotonia!
A mãe bate no pai
O pai bebe, coitado!
O filho, já sem remédio,
Precisa é de ser açoitado.
Tudo serve. Tudo vale.
E a gente ouve, ouve…
Que desespero…
Safa!
Trrim! … Trrim!...
E os filhos da gente
Em casa…
Aguardam…
(Bocejo)
Desesperam…
(Bocejo)
Adormecem…!
Já podemos ir pra casa?
Temos autorização?
Ou temos ainda de preencher
Papéis, papeladas, em vão?
Lá fora, a noite chega.
E a gente, aqui cerrada,
Imerge em documentação.
Assina aqui.
Rubrica acolá.
Alto! Assim, já não dá!
A gente quer é ser professor
E trabalhar, sem dor
Sem rancor…
Não quer ser sofredor!
Basta!
A nossa arte é ensinar:
Nas crianças, a sabedoria despertar!
Tudo o resto
(Papéis, papelinhos, papelotes!)
Que se dane! Pouco importa,
Perante a grandeza da vida.
Basta!
Porque esta nossa viagem,
Sem prazer, sem paixão,
Não tem volta.
É um bilhete só de ida
Apenas vida sofrida…




Adélia Silva, Cândida Passos, Elizabete Cerqueira, Manuela Gama, Paula Abreu – T 2

os violinos tocam de madrugada disse...

Coro dos Professores desiludidos

É tão stressante a nossa vida
É tão frustrante a nossa vida
Que a gente termina o dia
Sem ter uma mais valia
Ao menos se alguém me ouvisse
E esse alguém fosse um aluno
E esse aluno fosse meu…

O sol brilhando lá fora
A chamar-nos a toda a hora
Entrando pelos nossos vidros…
E nós aqui acorrentados
Tentando quebrar as amarras
Dos desinteressados
Dando voltas pela sala
Fazendo da poesia uma arte engraçada
E a vida passando de fora
E os dias correndo e até a hora…
E a gente p’raqui afrontados:
“ A aula que nunca mais passa.
Ó stora: o que quer que se faça?”
E a gente p’raqui desesperados
P’rós nossos alunos curvados
Pensando, inventando, recriando
E eles bocejando, bocejando, bocejando
Com os dedos debaixo da mesa
Vão teclando, vão teclando, vão teclando!

Turma 1
Rosa Fernandes
Clara Dias
João Lagarelhos
Cristina Araújo
António Soares

os violinos tocam de madrugada disse...

Coro dos Professores Contentes


É tão boa a nossa vida
É tão cheia de ociosidade
Que a gente veste garrido
Como se andasse em festa
Ao menos se alguém se reformasse
E esse alguém fosse um de nós
E esse um de nós fosse eu…

O sol brilha nas salas
Fazendo luz nas alminhas
Chegando decretos ao largo
Com ideias interessantes
(Quem será tão bom pensante?)
E a gente p’raqui amados
No aconchego das paredes
Curtindo as secretárias
Ensinando coisas bonitas.
Ensinando coisas bonitas
E os alunos com a cabeça lá fora
Imaginando-se nas árvores
Viajando nas nuvens pelo céu
Trazendo gritos da rua
(Qual será que gritou?)
E a gente p’raqui amados
No aconchego das paredes
Curtindo as secretárias
Ensinando coisas bonitas
Fazendo relatórios, correcções
Actas, testes, avaliações
Lendo convocatórias, assistindo a reuniões
E sonhando, sonhando
Sonhando
Que…
Ao menos se alguém se reformasse
E esse alguém fosse um de nós
E esse um de nós fosse eu…

Elisabete Macedo
Maria Alice Rodrigues
Maria José Cunha
Turma 2

os violinos tocam de madrugada disse...

Coro dos Moralistas

É tão limpa a nossa vida
Tão honesta e divertida
A gente veste a rigor
E a nossa pureza é o nosso odor
Ao menos se alguém sofresse
E se um de nós se perdesse
e se esse um fosses… Tu!!!

As pessoas penando lá fora
Fazendo lume, manifestações
Esse pobre povo que chora
Só porque não tem condições?
(Quem será que protestou?)
E nós aqui protegidos
Pelos decretos por nós redigidos
Sem privações, sem maldições,
preparados para as nossas reinações,
Discursando, discursando, discursando…
O vento trazendo aumentos
E que culpa temos destes tormentos?
Aumento do salário congelado?
Diz-lhes que o défice está controlado.
(Quem será que protestou?)

E nós aqui fechados
Na nossa redoma enclausurados
Sem crise, sem qualquer privação
Privação? Pura ilusão
Iludindo, iludindo, iludindo.

Carlos Oliveira, Paula Gomes, Paula Prata, Sílvia Carvalho
Turma 2

os violinos tocam de madrugada disse...

CORO DAS "GORDINHAS DESPERADAS"

É tão redonda a nossa vida
É tão cheínha a nossa vida
Que a gente veste de escuro
Como se andasse elegante.
Ao menos se o chocolate não engordasse e fosse verdadeirament light...

As misses ondulando na praia
Fazendo inveja à própria sombra
Ouvindo assobios lascivos
Dos seres que a areia povoam...
(O que é que elas não têm que eu tenha?!)
E a gente p'raqui fechadas
Na penumbra dos consultórios,
dos gabinetes do diétista, das massagens e da estéticista
Fazendo step, fazendo cárdio
Fazendo step, fazendo cárdio
E a fome andando cá dentro
Rumorejando no estômago
Levando o ânimo ao desânimo
Trazendo um grito profundo
(Maldita herança genética que tudo reténs em mim!)
Fazendo step, fazendo cárdio
Fazendo step, fazendo cárdio
Comendo sopa, comendo sopa
Alface, bolachinhas integrais e yogurtes naturais...
Contando as calorias...
Engordando, engordando,
Engordando...

Ana Paula Soares, Alexandra Sobral, Carla Coelho, Carla Nóvoas,Luísa Coelho ( T2) Paula Correia (T1)